Caracterização

A Bacia Hidrográfica do Rio Taquari (BHRT), localizada no Centro-Oeste do Brasil, ocupa área parcial nos Estados de Mato Grosso (MT) e Mato Grosso do Sul (MS), com a maior parte da área neste último. A BHRT ocupa uma área de 79.471,81 km2, fazendo parte da Bacia do Alto rio Paraguai, onde está inserido o Pantanal brasileiro. Observam-se duas compartimentações bastante distintas: uma refere-se a Bacia do Alto Curso do Rio Taquari (BAT), localizada no planalto, ocupando 35,1% da área e outra refere-se a Bacia do Baixo Curso do Rio Taquari (BBT), formando uma extensa planície de deposição na área pantaneira, ocupando 64,9% da área.
A BHRT é composta de áreas parciais de 16 municípios, sendo três municípios no MT, abrangendo 4,47% da área de estudo e 13 municípios no MS, abrangendo 95,53% da área restante. No MT destaca-se o município de Alto Araguaia que responde por 3,90% da bacia, já no MS destaca-se o município de Corumbá, que responde por 55,19% da bacia, seguido de Camapuã e Coxim com participação de 9,06% e 7,68%, respectivamente.
A geologia da BHRT é bastante diversificada e antiga. Verificam-se unidades geológicas desde a Era Pré-Cambriana Proterozóica com idade entre 2.600 a 570 milhões de ano (MA), período superior, como as rochas do Grupo Cuiabá, representando 0,07% da área, até unidades geológicas da Era Cenozóica com idade entre 65 MA a época atual, período Quaternário na época Holocênica, como os Aluviões Fluviais, representando 2,34% da área da bacia. Foram identificadas e quantificadas 16 unidades geológicas com informações cronoestratigráficas e litoestratigráficas.
As unidades geológicas mapeadas na área caracterizam muito claramente as duas grandes compartimentações existentes na bacia, a BAT (Planalto) com as rochas mais antigas e a BBT (planície) ainda em formação com sedimentos sendo depositados. Somente a Formação Pantanal do período Quaternário, responde por 62,16% da BHRT, representando 95,85% da área da planície. As rochas da Era Mesozóica (230 a 65 MA), período Cretáceo (Grupo Bauru) e período Jurássico (Grupo São Bento), cobrem 26,35% da área da BHRT e aproximadamente 75% do planalto da bacia. Destaca-se a unidade mapeada como Formação Pirambóia + Formação Botucatu do Grupo São Bento, cobrindo 14,4% da área de estudo ou 41% do planalto.
Na caracterização geomorfológica são destacados os aspectos morfológicos (morfografia e morfometria). Enquanto a morfografia trata da descrição das formas de relevo, a morfometria trata dos parâmetros relativos a dissecação e amplitude altimétrica do relevo. As unidades geomorfológicas da BHRT foram agrupadas em três categorias, de acordo com a morfogênese: Formas Estruturais, Formas Erosivas e Formas de Acumulação. Em seguida, as Formas Erosivas foram caracterizadas de acordo com os Tipos de Dissecação (a = formas aguçadas, c = formas convexas, t = formas tabulares). Para cada Tipo de Dissecação foram acrescentados os Índices de Dissecação, combinando duas informações: ordem de grandeza das formas de relevo (dimensão interfluvial média – ou amplitude horizontal), com cinco classes definidas, e intensidade de aprofundamento dos talvegues (grau de entalhamento dos vales – ou amplitude altimétrica), também com cinco classes definidas. Na BHRT foram mapeadas e quantificadas 34 classes geomorfológicas. As formas de acumulação predominam na maior parte da bacia, ocupando 65,31% do território, porém, em relação a parte baixa, elas ocupam a sua totalidade. As formas erosivas respondem pelo restante da área, destacando-se as formas erosivas tabulares, que ocupam 17,87% da BHRT ou metade do território do planalto.
Observa-se uma alta diversidade de solo na BHRT, em cujo levantamento foram identificadas, mapeadas e quantificadas 23 classes distribuídas em 81 unidades. O solo predominante na BHRT é o Podzol hidromórfico ocupando 34,98% da área da bacia, ocorrendo exclusivamente na planície, recobrindo 53,94% de sua área. Em seguida, os Planossolos (distróficos e eutróficos), ocupam 21,31% da área da BHRT, ocorrendo somente na parte baixa. As Areias Quartzosas recobrem 17,07% da bacia, ou quase a metade da área da alta bacia, em constante processo de erosão e transporte para a bacia baixa (Pantanal), sedimentando-a ininterruptamente.
A BHRT possui vegetação de duas grandes regiões fitoecológicas: Savana (Cerrado) e Floresta Estacional, além das formações pioneiras e áreas de transição. Foram mapeadas e quantificadas 17 classes de vegetação natural, uma de corpos d’água e uma classe de uso, referente a áreas onde a vegetação natural foi substituída por agricultura, pecuária e cidades. A cobertura vegetal natural da BHRT representa 77,39% do seu território, sendo que o restante já foi eliminado para diferentes utilizações. A vegetação remanescente é predominantemente de Savana (Cerrado), representado, ainda, 61,13% da bacia, ou 79,64% da vegetação nativa ainda existente. No domínio da Savana, a Formação Savana Arborizada (cerrado ou cerrado aberto) proporciona a maior contribuição, respondendo por 18,92% da bacia. As áreas de tensão ecológica, mapeadas como encraves e ecótonos, representam 13,28% da BHRT. As áreas de Florestas Estacionais estão praticamente desaparecendo, restando apenas algumas manchas na região, totalizando cerca de 2% da bacia.
A fauna característica da BHRT é muito diversa e exemplos de espécies ameaçadas de extinção podem ser citadas, associadas principalmente aos ambientes de margens de lagoas (arara-azul grande, galito), cerrado (tamanduá-bandeira, lobo-guará, onça-parda), campinas (codorna-buraqueira), matas galerias (bicudo, gato-maracajá), campos encharcados (cervo-do-pantanal, cabloclinho-de-chapéu-cinzento) e cursos de água ou banhados (ariranha). O desaparecimento da fauna na região vem sendo causado principalmente por perda de hábitats o que ocorre por fragmentação, alteração, ou redução dos seus ambientes.
O uso da terra é predominantemente agropecuário. As principais atividades econômicas desenvolvidas nos estabelecimentos agropecuários da bacia referem-se às atividades de pecuária, de atividade mista (pecuária e agricultura) e outras atividades (lavouras, horticultura, silvicultura e exploração vegetal, pesca e aqüicultura). De maneira geral a agricultura é praticada sobre os solos Latossolos e a pecuária sobre os solos Podzólicos e Areias Quartzosas. No entanto, a principal atividade econômica da bacia é a pecuária, desenvolvida extensivamente em 83% das fazendas. A pecuária é desenvolvida sobre o cultivo de pastagens dominado pelas gramíneas do gênero Brachiaria, com destaque para a Brachiaria humidicola na planície e Brachiaria Decumbens o planalto. O principal rebanho da pecuária é o de bovino de corte com um rebanho estimado em 3,6 milhões de cabeça em 2000, distribuídas em 4.143 estabelecimentos. A agricultura é praticamente desenvolvida no planalto, com destaque para soja e milho e, mais recentemente, algodão. Dos 4.553 estabelecimentos existentes na BHRT, 97,7% de suas terras são exploradas por seus proprietários. Os estabelecimentos agropecuários possuem um tamanho médio de 1.724 ha com desvio-padrão de 4.189 ha.
Nos 16 municípios que compõem a bacia há uma população de 265.000 pessoas (ano de 2000), com uma densidade demográfica de 2,01 hab/km2, sendo 83% na área urbana, com o município de Corumbá concentrando 37% da população. No entanto, se considerarmos somente as seis cidades do interior da bacia: Camapuã, São Gabriel do Oeste, Coxim, Rio Verde, Alcinópolis e Alto Taquari a população baixa para aproximadamente 91.000 pessoas. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) em 2000 foi estimado em 0,774, indicando um médio desenvolvimento humano na BHRT. O Índice da Dimensão Educação foi estimado em 0,856; o Índice da Dimensão Renda foi estimado em 0,699 e o Índice da Dimensão Longevidade foi estimado em 0,767.
A maioria dos problemas e impactos ambientais observados na BHRT tem sua origem nas partes altas, decorrentes das atividades humanas ali desenvolvidas. Portanto, para a compreensão das relações de causa e efeito relacionadas aos impactos identificados na planície, deve-se analisar integralmente a planície e o planalto, garantindo deste modo, o gerenciamento e a qualidade ambiental da região. Os impactos ambientais são decorrentes tanto de ações geradas pelas atividades humanas quanto por processos naturais. Neste contexto, a agropecuária e as obras de infra-estrutura, destacam-se como as principais atividades humanas desenvolvidas na BHRT, geradoras de impactos. Como processos naturais que ocorrem na BHRT e geram impactos na planície, destaca-se o aumento das precipitações no planalto ocasionando afluxo maior de água para a planície e a freqüente deposição de sedimentos advindos das partes mais altas, já que o Pantanal é uma planície sedimentar ainda em formação. Entretanto, nem sempre é tarefa fácil a identificação das origens dos impactos, pois na maioria das vezes os processos naturais são intensificados pelas atividades humanas. O desmatamento e o manejo inadequado do solo, o uso indevido de áreas impróprias, e o cultivo impróprio para o tipo de solo fizeram com que os problemas causados pelas atividades humanas aumentassem. O manejo inadequado do solo deu origem a voçorocas e ravinas imensas, observadas em toda a alta bacia, algumas com mais de 2,5 km de extensão e mais de 15 m de profundidade, com tendência a aumentar cada vez mais. As obras de engenharia, ao longo das estradas e nos pontos de saída das águas do leito viário, também dão origem a voçorocas e ravinas que se adentram pelas plantações ou pastos. A ocupação de áreas impróprias para implantação de infra-estruturas, tal como ferrovia Ferro-Norte, que atravessando o brejo da nascente do rio Taquari, causa impactos tais como obstrução da drenagem, assoreamento de canais de escoamento natural da água, alteração e degradação do habitat. Muitas vezes, um ravinamento começa com o pisoteio do gado em vertentes, o que pode ser visto com freqüência, indicando que escarpas e vertentes mais íngremes deveriam ser conservadas para evitar o movimento de massas. O assoreamento dos rios da BHRT pode ser observado em vários pontos do planalto e principalmente na planície, causando inundações em áreas que, até pouco tempo, eram usadas para a pecuária. Os problemas de erosão e assoreamento estão diretamente relacionados com problemas de natureza técnica ligados à agronomia e à engenharia civil. Embora se tenha a monocultura tecnificada como grande problema referente a erosão, na realidade os problemas são generalizados, tanto na agricultura, quanto na pecuária, e, sobretudo, na abertura e manutenção das estradas federais, estaduais, municipais e nos caminhos de serviços das fazendas e sítios, além das periferias urbanas. Há descuido generalizado com o trato das águas pluviais que são altamente concentradas de novembro a março, justamente quando se faz a agricultura da região. Nas propriedades agrícolas com mecanização, os cuidados com o escoamento das águas pluviais são feitos nos trechos onde se fazem as plantações, mas, nos terrenos mais abaixo, que normalmente são mais inclinados, as águas que se escoam pelos caminhos de serviços acabam por abrir grandes cicatrizes de erosão.
Nas fazendas do planalto com pecuária extensiva, onde os solos são preferencialmente arenosos do tipo Areias Quartzosas e Podzólicos Vermelho-amarelos e colinosos como em morros e escarpas, os processos erosivos são muito freqüentes e agressivos. Nessas condições, as erosões concentram-se em cabeceiras de drenagem, nos caminhos de serviços, nas estradas municipais, estaduais e federais, nas divisas das fazendas, nas trilhas de gado, nos pontos de bebedouros do gado, em margens de rios e córregos. Os leitos fluviais nessas áreas freqüentemente mostram-se assoreados pelo acúmulo de sedimentos preferencialmente arenosos. Na periferia urbana das cidades, a falta de cuidado com as águas pluviais faz com que ruas, edifícios e obras de infra-estrutura sejam destruídos, como por exemplo, o asfalto, guias, sarjetas e canalização de água de abastecimento, consumindo grande quantidade de recursos financeiros com obras de recuperação. Esses valores não são normalmente contabilizados, mesmo porque, nem sempre são mensurados.

Maiores informações podem ser obtidas em:
ABDON, M.M. Os impactos ambientais no meio físico – erosão e assoreamento na bacia hidrográfica do rio Taquari, MS, em decorrência da pecuária. (Tese de doutorado em Ciências da Engenharia Ambiental) - Centro de Recursos Hídricos e Ecologia Aplicada da Escola de Engenharia de São Carlos - Universidade de São Paulo, São Carlos: EESC/USP, 274 p., mar. 2004.

SILVA, J.S.V. Análise multivariada em zoneamento para planejamento ambiental, estudo de caso: bacia hidrográfica do alto rio Taquari MS/MT. (Tese de Doutorado em Engenharia Agrícola) – Faculdade de Engenharia Agrícola, Universidade Estadual de Campinas, Campinas: FEAGRI/UNICAMP, 307 p., dez. 2003.